Giosuè Mariot
- Giosuè
- Matteo Ignazio
- Pietro Mariot

Giosuè está no Ruolo della Popolazione de Pirado e Muda. Ele nasceu em 17 de janeiro de 1857, e era o terceiro filho de Matteo e Anna.[1]
Giosuè também foi o último dos irmãos a chegar em Urussanga. Ele não embarcou com a família rumo ao Brasil porque estava a servir no exército italiano.
Giovanni, irmão de Giosuè, era três anos mais velho que ele. É muito possível que os dois estivessem no exército ao mesmo tempo por um período de mais ou menos 2 anos. E é provável que Matteo tenha ido ao Brasil com Marco em 1879 porque ele era o único que não estava engajado em nenhuma outra atividade na época. Pietro tinha uma filha recém-nascida e provavelmente tinha condições de cuidar do resto da família por um tempo.
Giosuè na guerra
Alguns relatos dizem que Giosuè não apenas estava no exército, mas também foi para a guerra que estava a se desenrolar na região.[2, P. 6]
O problema é que não havia nenhuma guerra a se desenrolar na região. Aliás, a Itália não estava em guerra nesta época. Nem na Europa e nem em nenhum outro lugar.
Fatos
Na época desses eventos, o Reino da Itália possuía um sistema de alistamento militar obrigatório dos 20 aos 25 anos, portanto Giosuè deve ter servido entre 1877 e 1882.[3]
O único conflito armado em que o Reino da Itália se envolveu no fim do século XIX foi a Guerra Madista, que começou em meados de 1881 no norte da África e no oriente médio. A Itália na época tinha uma colônia na Eritréia, mas o primeiro conflito engajado por italianos ocorreu em 1890.
Por fim, o último conflito armado em solo italiano ocorreu durante a terceira guerra da independência italiana em 1866. A captura de Roma ocorreu em 20 de setembro de 1870, e marcou o fim das guerras de unificação.
Giosuè só pode ter participado de uma guerra se ele estivesse em um exército de outro país, o que é pouco provável.
Hipótese (Relato)
Um relato comum entre os Mariot, que foi repetido por Leda Mariot e Zelma Mariot, entre outros, é que como Giosuè estava servindo, assim que obteve notícias da família, ele decidiu desertar e foi para o Brasil clandestino no porão de um navio e foi descoberto em alto mar.[4][2, P. 6]
Porém, a verdade parece ter sido menos interessante.
Teoria
O Passageiro de Marselha
Se Giosuè desertou ou não, não se sabe, porque talvez ele não precisasse fazê-lo.
Existe um registro no arquivo nacional brasileiro de um imigrante chamado "Josué Mariotti", de 24 anos, que viajou sozinho na terceira classe, e que embarcou em Marselha em um navio a vapor chamado La France[5], operado pela empresa francesa Société Générale de Transport Maritimes[6] (S.G.T.M.), rumo ao Rio de Janeiro, chegando lá no dia 5 de maio de 1882[5] (meros 3 meses depois de Pietro e os demais Mariot de Longarone.
A S.G.T.M. fazia uma rota marítima entre Marselha e Nápoles com escala em Gênova e outra de Marselha para o Brasil e Argentina.[6] Os passageiros da lista da viagem de abril/maio de 1882 no La France embarcaram primeiro em Nápoles (em 14 de abril), depois Gênova e Marselha, portanto o navio estava fazendo o caminho de volta de Nápoles.

Suponhamos que o passageiro de Marselha fosse Giosuè. Ele era do Vêneto, e estava a bordo de uma embarcação francesa. Ele tinha um sotaque italiano, o que faz perfeitamente plausível que ele pronunciasse o nome Mariot com ênfase no "-t". Um francês facilmente poderia transcrever o nome para "Mariotti" por causa do sotaque. Os franceses também usam "J" para o mesmo som que nos dialetos italianos se escreve com "G", então também é perfeitamente plausível que o oficial da embarcação não escrevesse "Giosuè" como um italiano, mas como um francês o teria ouvido: "Josué".
Giosuè também não precisaria entrar clandestino em um navio. Nenhum dos Mariot ou outros imigrantes de Urussanga pagaram pelas suas passagens da mesma forma que se paga uma passagem de avião. Eles viajaram a crédito. A passagem era "gratuita".[7, P. 23]
Por fim, quando um passageiro clandestino é encontrado em alto mar, o evento precisa entrar no diário de bordo. Qualquer problema deste tipo seria reportado para as autoridades no Brasil. O passageiro do La France teve seu nome escrito normalmente na lista de passageiros, o que significa que ele provavelmente embarcou em condições normais. Se ele tivesse sido descoberto em alto mar e adicionado à lista de passageiros por uma gentileza da tripulação, seu nome estaria no fim da lista, não no meio.
Mas a pista mais marcante, além do nome e idade do passageiro de Marselha é o destino: depois de chegar ao Rio de Janeiro, o passageiro de Marselha dormiu em uma hospedaria destinada a imigrantes e no dia seguinte embarcou em um transporte marítimo rumo a Laguna[5], então uma cidade portuária importante no sul do estado de Santa Catarina e parada obrigatória da maioria dos imigrantes que iam para esta província.
Parece improvável que houvessem dois italianos, chamados "Giosuè Mariot" e "Josué Mariotti" em Santa Catarina, com a mesma idade, no mesmo ano.
Por outro lado, como veremos a seguir, Giosuè não foi imediatamente para Urussanga reclamar um lote de terra como os demais. Não é claro porque ele não soube que precisava ir a Urussanga nem em que condições ele foi notificado da partida dos irmãos.
O fato é que Giosuè não chegou ao Brasil com a família em março de 1882, porém, ele precisa ter chegado no Brasil antes de setembro de 1884, porque ele trabalhou na ponte que inaugurou naquele mês. O passageiro de Marselha satisfaz vários requisitos: nacionalidade, idade, destino, espaço de tempo e similaridade do nome. É muito provável que este tenha sido o próprio Giosuè.
No Brasil
Quaisquer que tenham sido as condições da sua chegada a Laguna, Giosuè eventualmente chegou lá. E diz a história que ele não sabia onde a família se encontrava. Mas com ou sem família, um homem precisa achar meios de se manter, e por isso Giosuè encontrou um emprego na região. Ele dirigiu-se para uma área em Laguna chamada Cabeçuda e trabalhou na construção de uma ponte por onde passaria uma estrada de ferro chamada Donna Thereza Christina (grafia usada na época). Essa ponte atravessa o mar na altura de Ponta das Laranjeiras, não muito longe de Laguna. Hoje há uma ponte suspensa ao lado chamada Ponte Anita Garibaldi, e de lá é possível ver claramente os restos da ponte desativada.
A estrada de ferro foi construída por uma empresa britânica chamada James Perry Co. e foi inaugurada em 1 de setembro de 1884. A esmagadora maioria dos funcionários da James Perry em Santa Catarina eram imigrantes italianos.[8], [9], [10]

Durante as obras da ponte, Giosuè foi atingido em uma das explosões e perdeu a mão direita.
Nesse período em que Giosuè viveu nos arredores de Cabeçuda, ele se envolveu com uma negra e com ela teve uma filha, Anna Mariot (Anita), nascida em meados de 1887. Infelizmente não se sabe o nome da moça, provavelmente por causa do preconceito exacerbado da época. Os negros foram submetidos à escravidão até 1888 e embora a escravidão não fosse tão prolífica no sul do Brasil nesta época, ela também não deixava de ser uma triste realidade. Não se sabe se a mãe de Anna era ou não livre. Caso não fosse, provavelmente tivesse sido libertada no ano seguinte.
Em algum momento dos três anos seguintes, Giosuè descobriu que a familia tinha se estabelecido em Urussanga, uns 70km a oeste de Laguna, mas na época era difícil chegar lá porque não haviam estradas. Os imigrantes eram normalmente transportados de Laguna para a colônia de Azambuja, e de lá para colônias menores, entre elas, Urussanga, acessível por uma trilha no meio da mata. Como parece que Giosuè não fez a rota tradicional por uma companhia de imigração, ele provavelmente teve que improvisar um jeito de chegar lá por conta própria.
Leda conta que Anna Fontanella sentia muita falta do filho e uma vez disse ter sonhado que tinha visto Giosuè subindo o morro em Urussanga, ao seu encontro, com o chapéu na cabeça. Diz a história que na mesma tarde ela estava sentada na frente de casa quando viu um homem de chapéu subir o morro, e logo em seguida ela disse para os presentes que um homem subia o morro e ele se parecia muito com o Giosuè. E era ele mesmo.[2, P. 7]
Assim Giosuè reencontrou a família em Urussanga e se instalou em Rio Salto, e em 29 de julho de 1889, com 32 anos de idade, casou-se com Teresa Rosso.[12]
Em 12 de abril de 1891, nasceu a segunda filha de Giosuè, Libera Mariot. Mas a vida com a nova família não durou muito. Um boato repetido por Leda e Zelma diz que Teresa morreu no parto da filha,[2, P. 7] mas na verdade ela morreu de febre tifóide em 23 de março de 1893, quando Libera tinha 2 anos de idade.[13]
Giosuè estava viúvo, maneta e com uma filha (na verdade duas), mas alguns meses depois, em 14 de agosto de 1893, com 36 anos, Giosuè casou-se novamente, no município de Tubarão. Sua segunda esposa foi Giovanna Cordella, 21 anos, com quem teve 10 filhos. Giovanna também viera da província de Belluno, da frazione de Igne em Longarone; ela chegou ao Brasil com os pais quando tinha 18 anos e perdeu um irmão de 8 anos a bordo do navio Duchessa di Genova 2 dias antes de chegar ao Rio de Janeiro.[14], [15]
Existem dois registros do casamento de Giosuè e Giovanna. O primeiro é o registro da diocese, datado 14 de agosto de 1893, e o segundo é o do registro civil, datado 13 de setembro de 1894. Isso se dá provavelmente porque Giosuè ainda não havia registrado o óbito de Teresa Rosso, o que ele fez apenas no dia 20 de setembro de 1893. E a filha Libera foi registrada apenas dia 8 de outubro.
Provavelmente eles não soubessem, mas o decreto nº 521 de 26 de junho de 1890 proibiu que se celebrasse matrimônio religioso antes da lavratura em assento de registro civil do casamento, impondo uma pena de seis meses de prisão aos párocos que infringissem tal norma.
O pai de Giosuè, Matteo, morreu 3 anos depois do casamendo, em 11 de maio 1896.
Leda Mariot diz que a mãe de Anna morreu quando a filha tinha mais ou menos 12 anos (portanto, cerca de 1899). E Giosuè por sua vez havia mandado buscar a filha em Laguna para morar com ele e sua esposa Giovanna em Urussanga.[2, P. 7]
Zelma Mariot também conta que Giosuè gostava muito de Anna e que as irmãs as vezes a antagonizavam. É dito que Anna tinha um problema em um dos olhos e usava um lenço dobrado para esconder esse problema.
Giosuè trabalhou por muito tempo em um lugar conhecido como o "Doze". O nome do lugar era na verdade "Serra do Doze", hoje conhecida como Serra do Rio do Rastro. A explicação é que "Doze" se refere ao décimo segundo quilômetro da estrada que parte de Orleans e vai para São Joaquim e hoje faz parte da rodovia SC-390. O quilômetro 12 fica em Lauro Müller. Essa região fica no pé da serra e hoje é uma reserva florestal chamada Parque Nacional de São Joaquim.[16], [17]
O relato da morte de Giosuè é que ele morreu de infarto enquanto trabalhava no Doze. A história diz que o corpo dele foi transportado para Urussanga em carros de boi e que a viagem teria levado seis dias porque os bois eram muito lentos e a estrada estava em más condições. Provavelmente esse relato foi um pouco exagerado, porque o percurso mais longo pode ser feito em 6 horas a pé.[18] Zelma esclarece como o processo ocorreu:
(...) [E]le foi sepultado em tempo hábil. Várias juntas de bois (prefiro omitir o número exato) iam sendo contratadas durante o percurso, em sistema de revezamento, para que o translado não sofresse atraso. Levem-se em conta as estradas, que mais pareciam picadas, não havia obras de arte para transpor os rios, e nem recebiam manutenção. E como foi isto? Um homem a cavalo ia na frente, e de tantos em tantos [quilômetros], onde encontrava uma família que tinha este recurso, pedia a solidariedade. Nova junta de bois em ação e assim por diante, até o destino. Quantas juntas? Talvez 6 quem sabe? Ou 5? Nada exato.
Z. M. Hilbert, comunicação pessoal, Urussanga, 2021.

A certidão de óbito de Giosuè é datada 4 de junho de 1921 e diz que ele morreu em Rio Bonito (Lauro Müller) aos 63 anos e não deixou bens. Giosuè na verdade tinha 64 anos.[19]
Há um relato sobre a morte de Giovanna Cordella que diz que ela havia morrido no parto da última filha. A filha mais nova de Giovanna e Giosuè era Antonia, nascida em 1911 e Giovanna foi a pessoa que notificou a morte de Giosuè em 1921.
Giovanna Cordella morreu dia 1º de setembro de 1921, quase três meses depois de Giosuè. Ela foi para Laguna tratar de um câncer maligno e morreu no hospital. Ela foi sepultada em Laguna. O registro de óbito diz que a causa da morte foi "carcinoma do collo e do corpo uterino", que é um jargão da época para "câncer cervical" ou "de colo de útero". Ela tinha apenas 49 anos.
O casal faleceu cedo. Quando Giovanna faleceu, a filha mais velha, Teresa, tinha 27 anos, e a mais nova, Antonia, tinha 10. Pietro tinha 19 e casaria 7 anos depois, Luigi tinha 24. E assim sucessivamente.
Anna Fontanella, a mãe de Giosuè, morreu apenas três anos antes do filho (e impressionantes 22 anos depois do marido), com 92 anos.
Dos filhos de Giosuè, 10 aparecem no registro de óbito, excluindo Libera. É possível que ela tivesse falecido antes. Ela teria 30 anos em 1921.
Leda Mariot providenciou um resumo sobre o destino dos filhos de Giosuè, exceto por Mario:[2, P. 7-10]
- Anna (Annetta, Anita): (1887) nasceu em Laguna, filha ilegítima, e morreu solteira aos 97 anos de idade. Anita adotou a sobrinha Elsa, filha de Luigi, uma vez que a mãe da menina falecera quando ela tinha apenas 40 dias.
- Libera: (12/04/1891) filha de Teresa. Casou com Arcangelo Muttini.
- Teresa: (05/07/1894) primeira filha de Giovanna. Casou com Giovanni De Marchi e viveram em Novo Horizonte, Lauro Müller.
- Mario: (30/09/1895) não consegui descobrir nada sobre Mario além da data de nascimento.
- Luigi: (16/04/1897) da mesma forma que o pai, ficou viúvo e casou duas vezes: a primeira com Rosa De Marchi e a segunda com Maria Mazzucco. A filha Elsa permaneceu com a tia, Anita, e os demais filhos foram com ele e a esposa para Curitibanos.
- Mansueto: (08/02/1900) casou com Emma Costa e ficou na casa do pai, mesmo depois de sua morte. Faleceu com 85 anos. Pai de Zelma Mariot.
- Pietro: (16/02/1902) casou com Dusolina de Brida, com quem viveu em Lauro Müller (os de Brida viviam no Doze). Mudaram-se para Dois Vizinhos, no Paraná. Viveu até os 98 anos. (Meu bisavô. Nunca o conheci, embora ele tenha morrido quando eu tinha 14 anos.)
- Rosa: (27/03/1905) casou com Davide Cittadin. Permaneceu em Rio Salto.
- Valentina: (27/05/1907) casou com Benevenuto Furtunatto Bez Batti. Morreu jovem, de tétano.
- Giuseppina: (1909) Não quis casar. Permaneceu em Urussanga.
- Antonia: (1911) casou com Guerino Possamai. Sofreu de diabetes e teve que amputar as duas pernas. É dito que o problema nunca a desmotivou e sempre teve muito ânimo.
E dois outros filhos são misteriosos:
- Maria / Marietta: talvez Marietta fosse apelido de Maria. Teria falecido relativamente jovem e nunca casado.
- Martin / Martino: teria morrido com 4 anos depois de contrair sarampo. Martino foi também confirmado pela neta de Giosuè, Zelma, mas nenhum registro civil ou paroquial foi encontrado até o momento.
Teoria
Giosuè era alfabetizado?
Sim. Giosuè sabia ler e escrever. E seus irmãos também. Quinto Baldessar relata que Pietro e sua esposa Lucia eram ambos alfabetizados, assim como Matteo e Anna.[20, P. 124] Muitas assinaturas de imigrantes no registro civil da época são nítidamente de pessoas desacostumadas a escrever e é natural presumirmos que muitos destes imigrantes eram analfabetos ou semi-analfabetos. E embora muitos fossem de fato analfabetos, dependendo do lugar de origem na Itália, o governo italiano financiava pelo menos 2 anos de escolaridade e muitos homens recebiam educação básica no exército.[21] A caligrafia feiosa de Giosuè se dá porque ele provavelmente era destro e passou a assinar com a mão esquerda. A teoria é que ele tenha perdido a mão hábil porque teria sido a mão usada para segurar um explosivo (ou defender-se de uma explosão, por reflexo). Ele usou a mão esquerda boa parte da vida adulta, mas caligrafia evidentemente não era uma prioridade.
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